MTE aponta excesso de jornada e repouso insuficiente em tripulação da Voepass dias antes da tragédia: 'Fadiga traz reflexos nefastos'
16/09/2025
(Foto: Reprodução) MTE vê excesso de jornada e repouso insuficiente em tripulação antes de tragédia
O auditor do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) que participou da investigação do acidente do voo 2283, que caiu deixando 62 mortos em Vinhedo (SP), em agosto de 2024, afirmou que tanto o comandante quanto o copiloto "não descansaram o período previsto em lei e realizaram jornadas superiores ao permitido nos dias que antecederam a queda da aeronave".
Segundo o Renato Bignami, ao refazer a jornada de trabalho da tripulação, com análises de diário de bordo, escalas de plantão, auditoria nos aeroportos e até mesmo hotéis e até mesmo transportes utilizados pela equipe, foi possível compreender que a Voepass descumpria a legislação, e que isso produzia "condições muito apropriadas para que estivesse presente a fadiga no momento do acidente".
Segundo Bignami, fadiga é o termo técnico utilizado, pois possui implicações e reflexos específicos para o trabalhador, e não uma hipótese de cansaço.
"A fadiga vai trazer reflexos nefastos ao trabalho, reduz a capacidade de atenção desse trabalhador, reduz a capacidade de resposta desse trabalhador a questões importantes no trajeto de um voo. (...) Lembrando que um voo não é algo simples, é um trabalho altamente profissional (...) Não combina nada com fadiga", enfatiza.
'81 segundos': g1 lança documentário sobre tragédia aérea em Vinhedo
Ainda de acordo com o auditor, a análise do MTE, que teve início após o acidente, faz parte das atribuições do sistema federal para garantir o cumprimento de legislação, já que se trata de um acidente de trabalho, em que havia quatro pessoas em atividade laboral no voo.
O trabalho tem natureza preventiva, buscando entender causas que levaram ao acidente e que possam criar condições para que "jamais voltem a ocorrer".
"Além disso, obviamente, buscar a responsabilização no âmbito administrativo, como é feito pelo sistema federal de inspeção do trabalho", explicou Bignami.
O que diz a Voepass?
O g1 pediu um posicionamento à Voepass sobre o relatório.
Em nota, a companhia informou que possui Programa de Gerenciamento de Risco de Fadiga (GRF), "documento técnico aprovado pela Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC), e segue regulamentação específica do setor, motivo pelo qual formalizamos defesa".
A empresa conclui que "somente o Relatório Final do Cenipa poderá apontar, de forma conclusiva, as causas do acidente".
Escombros de avião em Vinhedo (SP) no dia 10 de agosto de 2024
Nelson Almeida/AFP
R$ 730 mil em infrações
Ainda de acordo com o ministério, os principais problemas encontrados durante a fiscalização incluem:
falta de controle efetivo da jornada da tripulação;
descumprimento da Lei dos Aeronautas quanto a limites de jornada e períodos mínimos de descanso; e
violação de cláusula da Convenção Coletiva voltada à prevenção da fadiga.
Por conta dessas irregularidades, a Voepass recebeu 10 autos de infração, que podem gerar multas de aproximadamente R$ 730 mil. “Além disso, foi notificada por não recolher mais de R$ 1 milhão em FGTS de seus empregados”, frisou o MTE.
Tragédia aérea em Vinhedo: conheça histórias por trás de cada assento no voo 2283
O acidente
O avião, com 58 passageiros e quatro tripulantes, decolou de Cascavel (PR) com destino a Guarulhos (SP) e caiu no condomínio Residencial Recanto Florido, no bairro Jardim Florido, no início da tarde.
A aeronave decolou às 11h56 e o voo seguiu tranquilo até 12h20. Segundo a plataforma Flightradar, avião subiu até atingir 5 mil metros de altitude às 12h23, e seguiu nessa altura até as 13h21, quando começou a perder altitude.
LEIA TAMBÉM:
EXCLUSIVO: avião teve falha omitida em diário de bordo horas antes de decolar, diz testemunha
Áudios inéditos mostram conversas entre pilotos e controle aéreo minutos antes da queda; OUÇA
Bilhete de amor, terço e alianças: objetos saem intactos da tragédia e viram relíquias para famílias enfrentarem saudade
Nesse momento, a aeronave fez uma curva brusca. Às 13h22 — um minuto depois do horário do último registro — a altitude estava em 1.250 metros, uma queda de aproximadamente 4 mil metros. A velocidade dessa queda foi de 440 km/h.
A aeronave atingiu o quintal de uma casa do condomínio e os moradores saíram ilesos. Ninguém em solo ficou ferido. O morador da residência atingida afirma que a família ficou em choque.
Destroços de avião em Vinhedo
Miguel Schincariol/AFP
VÍDEOS: tudo sobre Campinas e região
Veja mais notícias sobre a região no g1 Campinas